sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Rotina


           Cheguei em casa e tudo estava extremamente organizado. Os móveis no lugar, a cama feita, a louça lavada e as roupas passadas guardadas no armário. Coloco minha bolsa do lado da porta e as chaves em uma mesinha perto. Pergunto-me como tudo ficou tão vazio, quando no passado eu costumava chegar e ouvir várias vozes ao mesmo tempo, a ponto de ficar perdida e não saber para quem dar atenção. Lembro que chegava cansada de um dia cheio de trabalho e ia para cozinha preparar o jantar, sem nem me importar. Lembro que ficava perdida no meio das receitas que nunca davam certo e em algum momento sempre vinha alguém dizer que eu era péssima naquilo e tomava todas as colheres da minha mão, para logo em seguida me dar um beijo no rosto e dizer que podia terminar por mim.
                Agora sou apenas eu parada na cozinha tentando decidir o que é mais fácil de fazer, a única que sobrou para comer. Antes, costumávamos sentar na frente da tv após a refeição e falar. Falar sobre o dia, sobre os problemas, as alegrias, tudo. Agora só posso conversar comigo mesma. Sempre a minha voz rondando minha cabeça. Fico deitada no sofá olhando as imagens transmitidas na tela, sem dar atenção a nada, sem me deixar prender a nada. Passam alguns minutos, talvez horas, não sei dizer, e estou entediada. Começo a procurar algo para fazer, algo para varrer, para limpar, para ocupar o que resta.
                Olho no relógio e percebo que ainda são oito e quarenta da noite. Não consigo dormir, nunca fui de ir para cama cedo. A impaciência começa a bater, começo a me desesperar. O sentimento de solidão começa a se fazer presente, parece que a cada dia mais forte. Quero conversar, abraçar, sentir-me segura de novo. Mas não me resta nada. Só o vazio. Só as paredes brancas.
                O chão começa a ficar mais próximo, meu rosto está extremamente úmido, meu peito aperta e não consigo respirar. Estou perdendo o controle. Prometi a mim mesma que isso não aconteceria. Prometi que dessa vez seria forte.
                Às quatro e meia da madrugada estou acordada. Estou arrumando os lençóis que arranquei, reorganizando a mobília que empurrei, chutei e tirei do lugar, lavando a louça que já estava limpa e recolhendo os cacos de vidro do chão. Estou organizando tudo outra vez, estou ocupando minha mente com a única saída que me resta. Às cinco e meia eu termino e minha casa está impecável de novo. Tomo banho e às seis e meia saio para o trabalho. Deixo aquilo que costumava chamar de lar igual ao que estava na noite anterior. Sei que vai ser a mesma coisa mais tarde, vou chegar, comer, sentar e quando perceber tudo vai estar revirado ou quebrado e logo em seguida irie passar a madrugada inteira arrumando cada mísero canto. Essa foi a forma que escolhi para lidar com a dor. Não é a melhor, mas é o que me impede de sentir demais.

                Por: Neilly Lucy

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